sábado, 29 de setembro de 2007

O que é o bullying?

Bullying é um termo de origem inglesa utilizado para descrever atos de violência física ou psicológica, intencionais e repetidos, praticados por um indivíduo (bully) ou grupo de indivíduos com o objetivo de intimidar ou agredir outro indivíduo (ou grupo de indivíduos) incapaz de se defender. A palavra "Bully" significa "valentão", o autor das agressões. A vítima, ou alvo, é a que sofre os efeitos delas. Também existem as vítimas/agressoras, ou autores/alvos, que em determinados momentos cometem agressões, porém também são vítimas de bullying pela turma.
Caracterização do bullying

No uso coloquial entre falantes de língua inglesa, bullying é usado com maior frequência para descrever uma forma de assédio perpetrado por alguém que está, de alguma forma, em condição de exercer o seu poder sobre alguém ou sobre um grupo mais fraco.
Estudiosos aceitam geralmente que o bullying contém três elementos essenciais:
o comportamento é agressivo e negativo;
o comportamento é executado repetidamente;
o comportamento ocorre num relacionamento onde há um desequilíbrio de poder entre as partes envolvidas

O bullying divide-se em duas categorias:
bullying directo;
bullying indirecto, também conhecido como agressão social

O bullying directo é a forma mais comum entre os agressores (bullies) masculinos.
A agressão social ou bullying indirecto é a forma mais comum em bullies do sexo feminino e crianças pequenas, e é caracterizada por forçar a vítima ao isolamento social. Este isolamento é obtido através de uma vasta variedade de técnicas, que incluem:

espalhar fofocas;
recusa em se socializar com a vítima
intimidar outras pessoas que desejam se socializar com a vítima
criticar o modo de vestir ou outros aspectos socialmente significativos (incluindo a etnia da vítima, religião, incapacidades etc).

O bullying pode ocorrer em situações envolvendo a escola ou faculdade/universidade, o local de trabalho, os vizinhos e até mesmo países. Qualquer que seja a situação, a estrutura de poder é tipicamente evidente entre o agressor (bully) e a vítima. Para aqueles fora do relacionamento, parece que o poder do agressor depende somente da percepção da vítima, que parece estar por demais intimidada para oferecer alguma resistência. Todavia, a vítima geralmente tem motivos para temer o agressor, devido às ameaças ou concretizações de violência física/sexual, ou perda dos meios de subsistência.

Características dos bullies

Pesquisas indicam que adultos agressores têm personalidades autoritárias, combinadas com uma forte necessidade de controlar ou dominar. Também tem sido sugerido que um déficit em habilidades sociais e um ponto de vista preconceituoso sobre subordinados podem ser factores de risco em particular.
Estudos adicionais têm mostrado que enquanto inveja e ressentimento podem ser motivos para a prática do bullying, ao contrário da crença popular, há pouca evidência que sugira que os bullies sofram de qualquer déficit de auto-estima.
Outros pesquisadores também identificaram a rapidez em se enraivecer e usar a força, em acréscimo a comportamentos agressivos, o acto de encarar as ações de outros como hostis, a preocupação com a auto-imagem e o empenho em ações obsessivas ou rígidas.
É freqüentemente sugerido que os comportamentos agressivos têm sua origem na infância:
"Se o comportamento agressivo não é desafiado na infância, há o risco de que ele se torne habitual. Realmente, há evidência documental que indica que a prática do bullying durante a infância põe a criança em risco de comportamento criminoso e violência doméstica na idade adulta."O bullying não envolve necessariamente criminalidade ou violência. Por exemplo, o bullying freqüentemente funciona através de abuso psicológico ou verbal.
Tipos de bullying

Os bullies usam principalmente uma combinação de intimidação e humilhação para atormentar os outros. Abaixo, alguns exemplos das técnicas de bullying:
Insultar a vítima; acusar sistematicamente a vítima de não servir para nada.
Ataques físicos repetidos contra uma pessoa, seja contra o corpo dela ou propriedade.
Interferir com a propriedade pessoal de uma pessoa, livros ou material escolar, roupas etc, danificando-os ou fazendo pilhérias por meio deles sobre um indivíduo, de qualquer forma.
Espalhar rumores negativos e fofocas sobre a vítima.
Depreciar a vítima sem qualquer motivo.
Fazer com que a vítima faça o que ela não quer, valendo-se de ameaças para se assegurar que a vítima seguirá as ordens.
Colocar a vítima em situação problemática com alguém (geralmente, uma autoridade), ou conseguir uma ação disciplinar contra a vítima, por acto que ela não cometeu ou que foi exagerado pelo bully.
Fazer comentários depreciativos sobre a família de uma pessoa (particularmente a mãe), sobre o local de moradia de alguém, aparência pessoal, orientação sexual, religião, raça, nível de renda, nacionalidade ou qualquer outra inferioridade depreendida da qual o bully tenha tomado ciência.
Isolamento social da vítima.

Usar as tecnologias de informação para praticar o cyberbullying (criar páginas falsas sobre a vítima em sites de relacionamento etc).
Chantagem.
Expressões ameaçadoras.
Grafitagem depreciativa.
Usar de sarcasmo evidente para se passar por amigo (para alguém de fora) enquanto assegura o controle e a posição em relação à vítima (isto ocorre com freqüência logo após o bully avaliar que a pessoa é uma "vítima perfeita").

Locais de bullying
O bullying pode acontecer em qualquer contexto no qual seres humanos interajam, tais como escolas, universidades, famílias, entre vizinhos e em locais de trabalho.

Escolas

Em escolas, o bullying geralmente ocorre em áreas com supervisão adulta mínima ou inexistente. Ele pode acontecer em praticamente qualquer parte, dentro ou em torno do prédio da escola.
Um caso extremo de bullying no pátio da escola foi o de um aluno da oitava série chamado Curtis Taylor, numa escola secundária em Iowa, Estados Unidos, que foi vítima de bullying contínuo por três anos, o que incluía alcunhas jocosas, ser espancado num vestiário, ter a camiseta melada com leite achocolatado e os pertences vandalizados. Tudo isso acabou levando-o ao suicídio em 21 de Março de 1993. Alguns especialistas em "bullies" denominaram essa reação extrema de "bullycídio".

Nos anos 1990, os Estados Unidos viveram uma epidemia de tiroteios em escolas (dos quais o mais notório foi o massacre de Columbine). Muitas das crianças por trás destes tiroteios afirmavam serem vítimas de bullies e que somente haviam recorrido à violência depois que a administração da escola havia falhado repetidamente em intervir. Em muitos destes casos, as vítimas dos atiradores processaram tanto as famílias dos atiradores quanto as escolas.
Como resultado destas tendências, escolas em muitos países passaram a desencorajar fortemente a prática do bullying, com programas projectados para promover a cooperação entre os estudantes, bem como o treinamento de alunos como moderadores para intervir na resolução de disputas, configurando uma forma de suporte por parte dos pares.
Dado que a cobertura da mídia tem exposto o quão disseminada é a práctica do bullying, os júris estão agora mais inclinados do que nunca a simpatizar com as vítimas. Em anos recentes, muitas vítimas têm movido ações judiciais diretamente contra os agressores por "imposição intencional de sofrimento emocional", e incluindo suas escolas como acusadas, sob o princípio da responsabilidade conjunta. Vítimas norte-americanas e suas famílias têm outros recursos legais, tais como processar uma escola ou professor por falta de supervisão adequada, violação dos direitos civis, discriminação racial ou de gênero ou assédio moral.

O bullying nas escolas (ou em outras instituições superiores de ensino) pode também assumir, por exemplo, a forma de avaliações abaixo da média, não retorno das tarefas escolares, segregação de estudantes competentes por professores incompetentes ou não-actuantes, para proteger a reputação de uma instituição de ensino. Isto é feito para que seus programas e códigos internos de conduta nunca sejam questionados, e que os pais (que geralmente pagam as taxas), sejam levados a acreditar que seus filhos são incapazes de lidar com o curso. Tipicamente, estas atitudes servem para criar a política não-escrita de "se você é estúpido, não merece ter respostas; se você não é bom, nós não o queremos aqui". Freqüentemente, tais instituições (geralmente em países asiáticos) operam um programa de franquia com instituições estrangeiras (quase sempre ocidentais), com uma cláusula de que os parceiros estrangeiros não opinam quanto a avaliação local ou códigos de conduta do pessoal no local contratante. Isto serve para criar uma classe de tolos educados, pessoas com títulos acadêmicos que não aprenderam a se adaptar à situações e a criar soluções fazendo as perguntas certas e resolvendo problemas.
Local de trabalho

O bullying em locais de trabalho (algumas vezes chamado de "Bullying Adulto") é descrito pelo Congresso Sindical do Reino Unido (TUC, 1998) como:
"um problema sério que muito freqüentemente as pessoas pensam que seja somente um problema ocasional entre indivíduos. Mas o bullying é mais do que um ataque ocasional de raiva ou briguinha. É uma intimidação regular e persistente que solapa a integridade e confiança da vítima do bully. E é freqüentemente aceita ou mesmo encorajada como parte da cultura da organização".
A opinião de um pisiquiatra sobre o bullying.

Vizinhança

Entre vizinhos, o bullying normalmente toma a forma de intimidação por comportamento inconveniente, tais como barulho excessivo para perturbar o sono e os padrões de vida normais ou fazer queixa às autoridades (tais como a polícia) por incidentes menores ou forjados. O propósito desta forma de comportamento é fazer com que a vítima fique tão desconfortável que acabe se mudando da propriedade. Nem todo comportamento inconveniente pode ser caracterizado como bullying: a falta de sensibilidade pode ser uma explicação.

Política

O bullying entre países ocorre quando um país decide impôr sua vontade a outro. Isto é feito normalmente com o uso de força militar, a ameaça de que ajuda e doações não serão entregues a um país menor ou não permitir que o país menor se associe a uma organização de comércio.

Militar

Em 2000 o Ministério da Defesa (MOD) do Reino Unido definiu o bullying como : "...o uso de força física ou abuso de autoridade para intimidar ou vitimizar outros, ou para infligir castigos ilícitos”.[

Todavia, é afirmado que o bullying militar ainda está protegido contra investigações abertas. O caso das Deepcut Barracks, no Reino Unido, é um exemplo do governo se recusando a conduzir um inquérito público completo quanto a uma possível prática de bullying militar.
Alguns argumentam que tal comportamento deveria ser permitido por causa de um consenso acadêmico generalizado de que a "soldadesca" é diferente das outras ocupações. Dos soldados se espera que estejam preparados para arriscarem suas vidas, e alguns acreditam que seu treinamento deveria desenvolver a força do corpo e do espírito para aceitar isto.
Em alguns países, rituais humilhantes entre os recrutas têm sido tolerados e mesmo exaltados como um "rito de passagem" que constrói o carácter e a resistência; enquanto em outros, o bullying sistemático dos postos inferiores, jovens ou recrutas mais fracos pode na verdade ser encorajado pela política militar, seja tacitamente ou abertamente (veja dedovschina). Também, as forças armadas russas geralmente fazem com que candidatos mais velhos ou mais experientes abusem - com socos e pontapés - dos soldados mais fracos e menos experientes.

.Alcunhas ou apelidos (dar nomes)

Normalmente, uma alcunha (apelido) é dada a alguém por um amigo, devido a uma característica única dele. Em alguns casos, a concessão é feita por uma característica que a vítima não quer que seja alardeada, tal como uma verruga ou forma obscura em alguma parte do corpo. Em casos extremos, professores podem ajudar a popularizá-la, mas isto é geralmente percebido como inofensivo ou o golpe é sutil demais para ser reconhecido. Há uma discussão sobre se é pior que a vítima conheça ou não o nome pelo qual é chamada. Todavia, uma alcunha pode por vezes tornar-se tão embaraçosa que a vítima terá de se mudar (de escola, de residência ou de ambos).

Efeitos do bullying

O bullying persistente pode ter uma série de efeitos em um indivíduo, e no ambiente onde o bullying ocorre.
Efeitos sobre o indivíduo incluem:
Depressão Reativa, uma forma de depressão clínica causada por eventos exógenos
Estresse de desordem pós-traumática
Tornar-se também um agressor
Ansiedade
Problemas gástricos
Dores não-especificadas
Perda de auto-estima
Medo de expressar emoções
Problemas de relacionamento
Abuso de drogas e álcool
Auto-mutilação
Suicídio (também conhecido como bullycídio)
Efeitos numa escola incluem:
Níveis elevados de evasão escolar
Alta rotatividade do quadro de pessoal
Desrespeito pelos professores
Alto nível de faltas por males menores
Porte de arma por parte de crianças visando proteção
Ações judiciais:
contra a escola ou autoridade responsável pela área educacional
contra a família do agressor
Efeitos sobre a organização (tal como um local de trabalho):
Perda de moral
Níveis elevados de faltas por depressão, ansiedade e dor nas costas
Queda de produtividade e lucro
Altos níveis de rotatividade de pessoal
Perda de clientes
Má reputação no meio empresarial
Repercussão negativa na mídia
Ações judiciais:
contra a organização por injúria pessoal
contra a organização e o agressor sob o império das leis anti-discriminaçã

Ministério vai rever estatuto do aluno para combater violência escolar




João Paulo Mendes


Júlio Almeida *

O Ministério da Educação quer intervir a nível da violência nas escolas com um reforço da autoridade dos docentes e dos órgãos de gestão dos estabelecimentos de ensino. Maria de Lurdes Rodrigues afirmou ontem que "as escolas, os professores e os conselhos de executivos têm que ser mais responsabilizados". Combater a violência escolar passa ainda, segundo a governante, por um quadro legal mais flexível e menos burocrático. Maria de Lurdes Rodrigues, que falava à margem da sessão inaugural da "Semana da leitura 2007", garantiu ainda que o estatuto do aluno está a ser revisto. Um novo diploma está a ser preparado para agilizar os procedimentos relacionados com a gestão da disciplina.O Estatuto do Aluno do Ensino Não Superior, lei de 2002, não aborda directamente a questão da violência, mas assinala que, por exemplo, é "papel especial dos pais e encarregados de Educação" o "con- tribuir para a preservação da disciplina da escola". O documento adianta que é dever do aluno "tratar com respeito e correcção qualquer membro da comunidade educativa", assim como "respeitar a integridade física e moral de todos os membros" da mesma.O secretário de Estado da Educação, Jorge Pedreira, explica que o objectivo da revisão deste estatuto "não é necessariamente aumentar a penalização dos alunos, mas sobretudo desburocratizar questões que podem ser tratadas muito mais facilmente". Por exemplo, o que hoje são advertências ou expulsões de alunos do contexto de aula são "alvo de grande burocracia", um processo que poderá agora ser mais fácil para os professores. Contudo, combater a violência é, no entender de outros responsáveis da Educação, uma tarefa que ultrapassa a própria escola. Esta é, por exemplo, a posição de Margarida Moreira, directora Regional de Educação do Norte, responsável por uma área onde na semana passada dois professores foram agredidos por familiares de alunos.Estes casos, explicou a responsável, acontecem com mais frequência em estabelecimentos "inseridos em meios com muitos problemas sociais", nomeadamente na zona do Cerco, rodeados de bairros, "onde há miúdos com fome, famílias desenraizadas, muitas com elementos detidos", disse. E, por exemplo, no agrupamento do Cerco, os professores pedem, sobretudo, "apoio das redes sociais". Isto é, um "trabalho de retaguarda para que se ajudem as famílias a perceberem o papel da escola".Parlamentares no terreno O tema da violência esteve ontem em destaque, com deputados da Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura a distribuírem-se em seis grupos, visitando cada um, duas escolas de agrupamentos do Grande Porto e da Grande Lisboa. No Porto, os deputados visitaram, de manhã, o Agrupamento de Escolas do Viso, onde há dias um professor de Educação Física foi agredido por um encarregado de educação e, durante a tarde, o Agrupamento Escolar do Cerco, onde na passada terça-feira uma professora de Educação Musical foi também agredida pela mãe de uma aluna à saída do estabelecimento de ensino. A reunião mantida com a direcção do agrupamento do Viso, disse a deputada Manuela de Melo, serviu para perceber que "há uma dinâmica própria na escola". Sobre a violência de pais de alunos sobre professores, a deputada não fez qualquer comentário remetendo para um relatório, com um levantamento dos principais problemas e dificuldades detectados, que a comissão parlamentar vai agora elaborar. Este documento, segundo a coordenadora da comissão parlamentar, deverá estar concluído em finais de Março ou princípios de Abril.




*Com Lusa

Definições, incidência e causas da violência em Portugal

João Amado & Isabel Freire

Em Portugal existem duas abordagens diferentes na investigação sobre a violência na escola. Na primeira, enquadram-se os estudos sobre a indisciplina, tomando como objecto as diferentes situações e comportamentos (sejam violentos ou não) que não estão em conformidade com as regras de carácter escolar e social vigentes em cada escola (Estrela, 1986; Amado, 1989; 2001; Freire, 1995; 2001; Veiga, 1995;1999). Na segunda abordagem, foca-se a violência como um fenómeno específico, realçando o seu carácter social e psicológico (Costa & Vale, 1998; Pereira et al., 1996; Almeida, A. 1999).

O comportamento violento distingue-se doutros tipos de comportamento pelo impacto negativo, tanto físico como emocional, que tem sobre aqueles a quem se dirige; ou seja, a violência implica a intenção deliberada de causar dano a outrem e, neste sentido, representa um problema disciplinar específico das escolas.
A violência na escola traduz-se numa grande diversidade de comportamentos anti-sociais (qualquer forma de opressão ou de exclusão social, agressões, vandalismo, roubo) que podem ser desencadeados quer por alunos quer por outros elementos da comunidade escolar. Estes problemas são, normalmente, associados quer a baixos níveis de tolerância quer a dificuldades no desenvolvimento moral e na auto-estima das vítimas e dos agressores. O fenómeno da violência está, também, intimamente associado aos princípios fundamentais da democracia e à defesa dos direitos humanos.
O problema do "maltrato entre iguais" (bullying) pode ser visto como um aspecto particular da violência na escola que, segundo a definição proposta por Olweus (2000), ocorre quando "quando um aluno ou uma aluna são expostos, repetidamente e durante um período de tempo, a acções negativas por parte de um ou mais alunos". A designação "maltrato entre iguais" deve ser usada quando existe uma relação assimétrica de poder entre alunos. Este tipo de agressões pode ser levado a cabo quer por um aluno individualmente quer por um grupo.
Os estudos sobre o "maltrato entre iguais" revelam que este fenómeno atinge tanto os adolescentes como as crianças, constituindo, assim, uma grande preocupação para os educadores, dada a sua influência no desenvolvimento dos alunos.
Em Portugal, tal como em outros países, as raparigas são com maior frequência vítimas de agressões indirectas (como seja a exclusão social, rumores pejorativos, entre outras) enquanto que os rapazes são mais frequentemente vítimas de agressões físicas e de ameaças (Pereira et al., 1996).

Incidência do problema

Em Portugal, como em outros países, nos últimos anos, a violência na escola tem tido cada vez maior visibilidade social, em grande parte, devido à acção dos media. Todavia, pode dizer-se que nas escolas portuguesas as situações de violência são raras. Apesar disso, a violência constitui uma preocupação fundamental, dado o potencial impacto negativo quer na vítima quer nos agressores quer, ainda, no clima geral da escola.
Em 1999, o Ministério da Educação português recebeu 1300 comunicações de situações de agressões contra alunos, professores, e outros membros da comunidade escolar. Do total de actos agressivos, apenas 55 foram desencadeados por alunos ou pais contra professores, pelo que a maioria dos actos de agressão ocorre entre alunos.
Um estudo desenvolvido com uma amostra de 6200 alunos em escolas públicas das áreas urbanas, suburbanas e rurais no Norte de Portugal (Pereira. B., Almeida, A.T., Valente, L., & Mendonça, D., 1996), verificou que 21% dos alunos apontam já ter sido agredidos por colegas, e 18% afirma já terem tido um comportamento agressivo, registando-se três ou mais vezes no ano transacto. Os comportamentos violentos mais frequentes são insultos, seguidos de agressões físicas, rumores pejorativos e roubo. Esse estudo também verificou que a maior parte das situações ocorrem no recreio.
Estudos etnográficos e ecológicos desenvolvidos por Amado (1998) e por Freire (2001) nos últimos três anos nas escolas e em duas áreas distintas de Portugal (as cidades de Coimbra e de Lisboa), com alunos de idades compreendidas entre os 11 e os 15 anos, mostraram que a violência entre alunos e professores é praticamente ausente. No entanto, cerca de 10% dos alunos vêem-se envolvidos em situações de violência entre colegas com carácter sistemático (vítimas e agressores), sendo este um fenómeno essencialmente masculino. Os autores observaram que apenas um pequeno grupo de alunos se confronta com situações agressivas na escola. Na sala de aula estas situações ocorrem apenas em contextos específicos e com determinados professores (liderança permissiva, elevado absentismo do professor, cultura de escola caracterizada pela desresponsabilização geral). A mais típica forma de violência na escola é a agressão verbal, que se manifesta, a maior parte das vezes, de forma ocasional, ou seja, raras vezes tem um carácter de agressão sistemática da mesma pessoa.

Causas

No que se refere à forma específica de violência designada por "maltrato entre iguais" (ou bullying), as principais causas parecem ser psicológicas. Geralmente, tanto as vítimas como os agressores manifestam baixa auto-estima e têm um fraco poder de influência nas relações interpessoais com os pares. As vítimas, normalmente, não têm amigos, apresentam uma aparência física mais frágil do que a dos seus pares e são muito protegidos pelos pais (principalmente pelas mães). Normalmente, os pais dos agressores e das vítimas não estão ao corrente da situação e isto torna esta mesma situação mais problemática.
Convém também fazer referência a outros tipos de violência que afectam a escola, como seja os grupos organizados ou gangs; nestes casos, as causas parece estarem, normalmente, associadas a problemas económicos, sociais e étnicos, como, famílias disfuncionais e destruturadas, pobreza, racismo ou outros tipos de discriminação sistemática, e modelos sociais violentos propagados pelos media.
Alguns investigadores têm salientado o impacto da cultura e clima de escola e outros aspectos associados com a sua estrutura e dinâmica interna, que contribuem para a redução ou aumento da violência. Em Portugal tem-se verificado o desenvolvimento de programas de intervenção na escola que adoptaram esta perspectiva no combate à violência (intervenção nos recreios, desenvolvimento da relação escola-comunidade-família, por exemplo). A investigação mostra que a violência na escola (quer seja sistemática ou ocasional) é um fenómeno de carácter multifactorial, com diferentes expressões e múltiplas causas, em cuja prevenção a escola tem um poderoso impacto.

Literatura e links

Almeida, A. T., (1999), "Portugal". In Smith, P. K., Morita, Y.,Junger-Tas, J., Olweus, D., Catalano, R. and Slee, P. (Eds.). The Nature of School Bullying: a Cross-national Perspective. New York andLondon: Routledge.
Almeida, A. T. et al., School-based Promotion of Social Competenceand Anti-violence Policies. European Conference on Initiatives toCombat School Bullying: National Posters.http://www.gold.ac.uk./enconf/index.html
Amado, João S., (2001), Interacção pedagógica e indisciplina na aula, Porto, Edições ASA.
Amado, João S., (1989), A indisciplina numa Escola Secundária.Lisboa: Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação daUniversidade de Lisboa. (Tese de mestrado, texto policopiado).
Costa, M. E. & Vale, D., (1998), A violência nas escolas. Lisboa: Instituto de Inovação Educacional.
Costa, M. E. & Vale, D., (1998), A violência nas escolas. Lisboa: Instituto de Inovação Educacional.
Estrela, M. T., (1986), Une étude sur l'indiscipline en classe. Lisboa: INIC.
Estrela, M. T., (1998), Relação pedagógica, disciplina e indiscplina na aula. Porto: Porto Editora, 2ª Edição.
Estrela, M. T. & Amado, J. S., (2000), Indisciplina, Violência eDelinquência na Escola. Revista Portuguesa de Pedagogia. Ano XXXIV, nº1-3.
Freire, Isabel P., (1995), "Perspectivas dos Alunos acerca dasRelações de Poder na Sala de Aula - Um estudo transversal". In Estrela,A., Barroso, J. & Ferreira, J. (Eds.). A Escola: Um Objecto deEstudo. Lisboa: AFIRSE Portuguesa, Faculdade de Psicologia e deCiências da Educação da Universidade de Lisboa, pp. 755-768.
Freire, Isabel P., (2001), Percursos disciplinares e contextosescolares. Dois estudos de caso. Lisboa: Faculdade de Psicologia e deCiências da Educação da Universidade de Lisboa. (Tese de doutoramento,texto policopiado).
Olweus, Dan, (2000), Bullying at School. Oxford: Blackwell Publishers, Ltd.
Pereira, B. et al., (1996), "O bullying nas escolas portuguesas:análise das variáveis fundamentais para a identificação do problema".In Almeida, Silvério e Araújo (Org.) Actas do II CongressoGalaico-Português de Psicopedagogia da Universidade do Minho. Braga:Universidade do Minho.
Pereira, B., Neto, C. & Smith, P., (1997), "Os espaços derecreio e a prevenção do bullying na escola". In Neto, C. (Ed.). Jogo edesenvolvimento da criança. Lisboa: Faculdade de Motricidade Humana,U.T.L., pp. 238-257.
Veiga, F. H., (1995), Transgressão e Autoconceito dos Jovens na Escola. Lisboa: Fim de século.
Veiga, F. H., (1999), Indisciplina e Violência na Escola: Práticas
Comunicacionais para Professores e Pais. Coimbra: Livraria Almedina.

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Last Updated: August 26, 2005

Prevenir a violência

Definição

Definir o conceito de violência é uma pré-condição importante quando se discutem a suaprevalência, as causas e implicações para a intervenção e a prevenção.Torna-se especialmente importante no contexto de discussões e projectosinternacionais, nos quais as percepções acerca da violência sãoinfluenciadas pela cultura e a história, a língua e do sistemaeducativo.
"Violência" é frequentemente confundida com outrostermos que descrevem fenómenos semelhantes como "maus tratos entreiguais/bullying" ou "agressão". Enquanto que, nalgumas definições, ofoco é a violência física, outras incluem também violência verbal epsicológica. A abordagem da violência segundo diferentes perspectivasdisciplinares apresenta-se controversa (Schäfer & Korn, 2000).
Duas definições de violência geralmente aceites a nível internacional, são as de Olweus e da Organização Mundial de Saúde (OMS):
Olweus(1999, p. 12): A violência é "o comportamento agressivo em que o autorou perpetrador utiliza o seu próprio corpo ou um objecto (incluindo umaarma) para provocar danos (relativamente graves) ou desconforto noutrapessoa ".
OMS (1999, p.2): "O uso intencional, efectivo ou sob a forma de ameaça,de força física ou poder, contra si-próprio, contra outra pessoa, grupoou comunidade, do qual resulte, ou possa resultar com grandeprobabilidade, dano físico ou emocional, morte, perturbação dodesenvolvimento ou privação".
Quando falamos de violência na escola, o termo bullying ou o seu equivalente noutras línguas é habitualmente utilizado (Finlandês:"koulukiusaaminen", Dinamarquês: "mobbe", Alemão: "Mobbing", Português:"maus tratos entre iguais").
Olweus (1993, p. 9) estabelece a seguinte definição geral de maus tratos entre iguais:
"Um estudante é agredido ou vitimizado quando é exposto repetida efrequentemente a acções negativas por parte de um ou mais colegas seus."
Até mesmo esta abrangente e genérica definição não inclui todo oconjunto de actos violentos (ex.: não menciona actos violentos ouagressivos da parte de professores contra alunos.
No entanto, no projecto VISIONARY, aceitamos esta definição de Olweus,uma vez que é suficientemente ampla para unir as diferentesperspectivas dos nossos países e é um bom ponto de partida para odesenvolvimento de discussões acerca da violência na escola, dos maustratos entre iguais e a sua prevenção.
Prevalência
Como referimos na secção "definição", há grandes diferenças no modo como a violência é definida. Em alguns estudos, o termo nem sequer é definido. Além disso, têm sido utilizados diferentes instrumentos e métodos na recolha de dados. Todas estas diferenças permitem apenas comparações limitadas entre a informação dos diversos países.
Todas as semelhanças e diferenças que serão referidas nesta secção devem ser vistas como tendências e interpretadas com precaução.
Na Dinamarca, Finlândia, Alemanha, Portugal e Reino Unido observam-se as seguintes tendências comuns (para detalhes comparar as secções nacionais):
Se bem que a violência, particularmente os maus tratos entre iguais, seja vista como uma parte "normal" da vida escolar, ocorrem, muito raramente, situações violentas graves.
A forma típica de violência na escola é a agressão verbal.
A maioria dos estudos indica um aumento da violência desde meados da década de 80 ao início da década de 90.
O aumento da violência na escola é menor do que aumento da violência juvenil em geral.
Em todos os nossos países, a violência juvenil está a tornar-se cada vez mais visível nos media.

Causas
Em todos os nossos países, numerosos estudos revelam que tanto desenvolvimento violento e do comportamento que põe os alunos em risco de se tornarem vítimas não se relaciona com uma única causa, mas com numerosas causas que interagem de uma forma complexa.
As seguintes causas são geralmente associadas ao desenvolvimento de comportamento violento (para detalhes comparar as secções nacionais):
violência parental,
a família é francamente desfavorecida (pais desempregados ou dependentes do apoio da Segurança Social)
modelo de educação familiar inconsistente
baixo nível de instrução
necessidade de estímulo elevada
baixo nível de autocontrole
inserção em grupos de pares violentos e pressão social
exclusão social dos imigrantes
influência dos media
As causas seguintes têm sido associadas com a probabilidade de se tornar vítima:
modelo de educação familiar rígido
isolamento e falta de popularidade na turma
baixo nível de autoconfiança e maior tendência para a depressão
comportamento mais defensivo
menor número de amigos.

Referências bibliográficas
Olweus, D., (1999), Sweden. In P.K. Smith et al. (eds),The Nature of School Bullying: A Cross-National perspective. London: Routledge.
Olweus, D., (1993), Bullying at school. What we know and what we can do. Oxford: Blackwell.
Pfeiffer, C., (1998), Trends in Juvenile Violence in European Countries. Download: http://www.ncjrs.org/pdffiles/fs000202.pdf
Schäfer, M. & Korn, S., (2001), Tackling violence in schools: A report from Germany. Download: www.goldsmiths.ac.ac.uk/connect/reportgermany.html
World Health Organisation, (1999), " WHO information series on School Health ", Document 3, WHO, Geneva.

Violência na escola

Muitas vezes os professores calam com medo. São sujeitos a agressões físicas e verbais e calam. Calam por não verem o apoio necessário nas estruturas; desde os conselhos executivos ao gabinete ministerial. Calam porque sabem que no final são considerados culpados das atitudes violentas dos alunos.
O que se passa neste momento, em alguma turmas de curriculos alternativos do ensino básico deveria ser alvo de profunda análise.
Os professores entram na sala com medo, ansiando pelo fim do ano para se verem livres da tortura a que são sujeitos. Não ensinam nada, porque sabem que os alunos também não querem aprender nada. Apenas sabem que no final do ano há que atribuir positiva. Assim ficam livres, pelo menos daqueles, sempre na esperança que os do próximo ano sejam um bocadinho melhores. Tentam sobreviver dentro da sala de aula, mantendo dentro do possível um aparente equilíbrio emocional que não os deixe serem apontados como "casos" pelos restantes colegas e pelos orgãos de gestão.
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Violência na Escola - verdadeira ou falsa questão?





De um momento para o outro, a violência parece ter invadido as escolas portuguesas. Os relatos de agressões e de vandalismo fizeram durante algum tempo as primeiras páginas dos jornais, dando a impressão de se estar a viver um autêntico estado de sítio. As televisões mostraram escolas equipadas com câmaras de vigilância que, afinal, não serviam para controlar desacatos entre alunos, mas sim para identificar os autores de assaltos às escolas, esses sim cada vez mais frequentes.
Mais uma vez, os "opinion makers" da capital, baseando-se no cenário vivido em algumas zonas problemáticas das áreas urbanas da Grande Lisboa e do Grande Porto, declaravam que a escola estava a viver uma crise de valores. Mas será realmente assim? As escolas portuguesas são tão violentas como se diz? Estará a chegar-se ao dia em que os alunos só entrarão na escola depois de passarem por um detector de metais, como acontece em muitos estabelecimentos de ensino dos Estados Unidos?
Em Portugal, não existia, até há pouco tempo - e continua a não existir de forma sistemática - qualquer investigação que caracterize com relativa exactidão o que se passa nas escolas neste domínio. As únicas excepções são dois estudos parcelares (um da responsabilidade do Instituto de Estudos da Criança da Universidade do Minho - cuja amostra se limitou a 18 escolas do distrito de Braga -, e um outro coordenado por Daniel Sampaio e uma equipa de investigadores, no âmbito do Programa de Promoção e Educação para a Saúde), mas nenhum deles realizado no sentido de caracterizar comportamentos, contextos e pessoas envolvidas em situações consideradas violentas no meio escolar.
Em 1996, no âmbito de um protocolo celebrado entre o Instituto de Inovação Educacional e a Universidade do Porto, Emília Costa e Dulce Vale, investigadoras da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da UP, iniciaram um estudo a nível nacional em 142 escolas dos 2º e 3º ciclos do ensino básico e do ensino secundário, num total de 4925 alunos distribuídos pelos 8º e 11º anos de escolaridade, que ficou concluído em 1997. Apesar de as próprias autoras o considerarem essencialmente de "carácter exploratório" e de preconizarem a necessidade de uma análise numa perspectiva de desenvolvimento-sistemática, ele constitui, ainda assim, o mais completo quadro de referência para abordar esta questão.
Nele, e antes de se iniciar quaisquer considerações de carácter metodológico e de análise de resultados, alerta-se para o facto de a violência não poder ser entendida como um conceito único, remetendo-se para domínios tão diversificados como "a assertividade e outras competências sociais à delinquência, passando pelos comportamentos disruptivos ou anti-sociais, pela simples hiperactividade ou pela violência e vandalismo (...)".
Assim, quando se fala de violência deve atender-se aos diferentes conceitos que lhe estão associados, muitas vezes sobrepostos entre si: vandalismo (destruição ou degradação gratuita de objectos), "bullying" (termo anglo-saxónico que denomina, grosso modo, "implicar com as pessoas"), agressividade, perturbações de comportamento, passagens ao acto (entendidas como um meio de expressão de angústias, associada à adolescência, ), comportamentos de oposição (total falta de cooperação com a "autoridade" de pais e professores), perturbação da atenção com hiperactividade; comportamento delinquente; défice de competências (problemas de comportamento por incapacidade para lidar com essa situação ou a inedaquação das competências utilizadas) e factores desenvolvimentais vários (próprios da adolescência, como o sentido de grupo e os comportamentos adquiridos sob essa influência recíproca).
Para lembrar o "carácter normativo" deste último conceito, aliás, as autoras citam uma expressão retirada de uma obra de um investigador anglo-saxónico, onde se refere que já no século V a.c. um autor grego afirmava: "os jovens de hoje adoram o luxo; não têm maneiras, ridicularizam a autoridade e não têm nenhum respeito pelos seus progenitores. Os filhos são verdadeiramente uns pequenos tiranos. Já não se levantam quando uma pessoa de idade entra na sala onde estão, contrariam os pais, estão à mesa como glutões e fazem a vida um inferno aos professores".
A violência é uma "parangona"
Segundo o estudo conduzido por Emília Costa e Dulce Vale, a influência de variáveis institucionais, para além das individuais e familiares, é um dos "domínios de importância fundamental" para explicar a ocorrência de actos violentos no meio escolar. Recorrendo a estudos similares de autores estrangeiros, refere-se que, "contrariamente ao que é difundido", estes apontam para a "inexistência de um efeito significativo do tamanho da escola ou do tamanho médio das turmas, o mesmo acontecendo com a diversidade étnica". No entanto, adianta-se, "parece haver uma maior incidência de problemas de agressão em escolas de áreas desfavorecidas, mas não necessariamente rurais, onde os problemas parecem ser inferiores aos de escolas de meios urbanos".
Partindo da sua experiência, Helena Carvalho, professora de Português/Francês na Escola Secundária do Cerco, confirma essa ideia. Ao longo da carreira passou por diferentes escolas e ciclos de ensino e considera que existe uma diferença "substancial" entre os alunos dos dois meios. No entanto, quer num quer noutro, os actos de violência e de indisciplina devem-se geralmente ao mesmo motivo: alunos que "recusam o sistema". E se nas zonas do interior a figura do professor ainda é "respeitada" e consegue exercer alguma influência, nos meios urbanos ela está "completamente degradada".
Arménio Cordeiro, professor de educação física na mesma escola, considera, por seu lado, que os actos de violência entre alunos podem ser entendidos como "disputas normais" de adolescentes, que só em raras ocasiões chegam a "vias de facto". "Sempre existiu este tipo de violência na escola, ela não é novidade para ninguém".
Os alunos parecem concordar. "Não existe mais violência e indisciplina aqui do que noutras escolas. Esta já foi uma escola problemática, mas agora é absolutamente normal. E quando há algum problema entre os alunos, normalmente não se passa dos insultos. 'Andar à porrada' já não se usa...", diz Nuno Pinto, de 19 anos.
Já Ricardo Nogueira, de 13 anos, tem uma opinião diferente. Para ele, que é do "bairro" - situado na freguesia mais desfavorecida do Porto e referenciado habitualmente como um dos mais problemáticos da cidade -, a escola não constitui um problema, mas admite que para outros alunos a convivência seja por vezes um pouco "difícil". Não explica é em que medida, limitando-se a encolher os ombros quando questionado. Por seu lado, Filipa Gonçalves, de 18 anos, acha que os actos violentos entre alunos se limitam aos mais novos e se devem essencialmente a "rivalidades". Os alunos mais velhos, garante ela, resolvem os problemas com calma. "Aqui há mais mentalidade", sublinha.
Ainda na opinião destes dois alunos, o "ambiente familiar" contribui decisivamente para o comportamento na escola. A Filipa afirma que "no bairro as pessoas resolvem conflituosamente as questões e isso é transmitido aos filhos". Um cenário que se pode repetir em outros contextos, é sabido, e que as investigadoras reforçam na sua tese, referindo que, independentemente do meio sócio-económico, "a agressividade e hostilidade por parte dos jovens pode ser o resultado da exposição a certas atitudes e comportamentos em casa, nomeadamente o uso habitual da punição física, que ensina que a agressividade é um modo aceitável de resolução de conflitos". A hereditariedade é outra das hipóteses levantada por alguns investigadores, mas a este respeito os dados são inconclusivos.
"Acho que não se pode afirmar que exista uma presença generalizada da violência na sociedade e nas escolas. Isso é uma 'parangona'. Existem, isso sim, focos de violência localizados, que reflectem essencialmente o meio onde se situam", diz Fátima Pinto, presidente do conselho executivo da secundária do Cerco.
Violência ou indisciplina?
Apesar de tudo, os números relativos à violência nas escolas apresentados neste estudo não podem ser encarados com tranquilidade. De acordo com os resultados a agressão de que os alunos portugueses mais referem ter sido vítimas é a física e a verbal: 63% dos alunos referem já ter sido empurrados, 29% referem já ter sido batidos, 67% foram insultados e 54% já foram ameaçados com palavras ou gestos. As autoras referem-se ainda ao "número elevado" de raparigas que refere ter sido alvo de comportamentos indesejados com conotação sexual, sem, no entanto, especificar esse valor. Um aluno em cada dez já foi abordado no sentido de adquirir ou consumir drogas e um em cada quatro refere ter sido assaltado, roubado ou vítima de destruição de propriedade.
Globalmente, os agressores mais referidos são os próprios colegas, seja no interior ou no exterior da escola, permitindo ainda a análise dos resultados mostrar que uma pequena percentagem de "outras pessoas da escola" são referidas como agressores, sobretudo em termos físicos e verbais. Importante é também o facto de uma percentagem, ainda que pequena, de pessoas estranhas à escola agredirem física e verbalmente os alunos, sendo vistos a consumir drogas ou bebidas alcoólicas e a praticar actos de vandalismo contra os bens da escola.
De todas as regiões consideradas, é no Litoral Centro que os alunos mais referem ter sido vítimas, na escola, de comportamentos como agressões físicas, empurrões (que não a brincar), ameaças verbais, assalto ou roubo de objectos e destruição de objectos pessoais. Quanto ao local onde ocorrem, as agressões são, em geral, mais frequentes no interior da escola.
De um modo geral, os alunos mais vítimas de agressão física e verbal e de actos de vandalismo são os do 8º ano e rapazes. No entanto, são as raparigas as maiores vítimas de violência sexual. Estes resultados, salientam as autoras, vão de encontro ao que normalmente é apontado na literatura e investigação sobre o tema, segundo a qual as principais vítimas da generalidade dos comportamentos referenciados são os alunos mais novos e do sexo masculino.
De qualquer maneira, e apesar de reconhecerem que estes números não podem ser ignorados, os professores contactados pela Página preferem destacar a indisciplina como o principal problema das escolas. Nesse sentido, Fátima Pinto reconhece que ela hoje está mais presente, "mas não de forma irreverente, como antes acontecia", e poderá dever-se à "desarticulação entre o que se pretende incutir na escola e o que os alunos recebem das famílias".
"Claro que a violência não é uma falsa questão, até porque está instalada na sociedade e reflecte-se necessariamente na escola. Mas considero que em algumas situações ela é empolada pela comunicação social e possa dar a ideia de que é generalizada", afirma Daisi Leitão, presidente do conselho executivo da escola secundária Carolina Michaelis. "Este ano já tivemos quatro ou cinco alunos que foram castigados por participarem em actos que consideramos violentos, mas estamos longe de isso constituir uma situação rotineira e grave".
Neste capítulo, aliás, as autoras referem que "a impulsividade e a energia características destas idades são também algo a considerar e a ter em conta na reacção dos adultos e na sua actuação com os jovens, levando-os a questionar o "rótulo" de violência quando pode estar em causa algo completamente distinto". Mais: "Estas dimensões comportamentais parecem-nos de relevo, principalmente se pensarmos que a maioria das escolas não possui actividades para a ocupação dos tempos livres dos alunos, que muitas das actividades de complemento curricular não vão ao encontro dos seus interesses e, mais grave ainda, que muitas escolas não possuem condições físicas para a prática de educação física e muito menos para a prática de qualquer desporto (...)".
Em jeito de conclusão, Emília Costa e Dulce Vale afirmam que "independentemente da abordagem seguida ou da especificidade das actuações" - lembrando que são mais numerosas as reflexões teóricas do que a apresentação de verdadeiras estratégias de intervenção - "nunca é demais destacar que elas não devem ser desligadas de uma abordagem global da escola e, particularmente, das relações no seu seio, apoiadas numa constante aprendizagem da convivência. Este sim, talvez o verdadeiro "antídoto" para a violência (...)".
Ricardo Jorge Costa

Autor do Artigo
Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação


Inf. sobre o artigo
Jornal "a Página"Nº 101
Ano 10 Abril 2001
Pag. 16